Quando pensamos em maternidade, logo nos vêm à mente imagens de cuidado, desafios e aprendizados. Mas como é essa experiência para mulheres autistas? O estudo de Dugdale e colaboradores (2021) mergulhou nas vivências de nove mães autistas e trouxe uma resposta poderosa: a maternidade, para elas, é marcada por uma conexão profunda com seus filhos — mas também por lutas silenciosas por compreensão, apoio e reconhecimento.
Maternidade vivida a partir do autismo
Essas mães relataram que o autismo está presente em cada aspecto da maternidade: desde a forma como constroem vínculos com os filhos, até como organizam a rotina e reagem a sobrecargas sensoriais. Muitas têm filhos que também são autistas — e essa identificação cria laços fortes, sensíveis e muitas vezes intuitivos. “Somos como ervilhas na mesma vagem”, disse uma das participantes.
Por outro lado, também surgem conflitos: como conciliar as necessidades sensoriais da mãe e da criança, que nem sempre se alinham? Como lidar com a culpa de perceber no filho as mesmas angústias que marcaram sua própria infância?
A luta por reconhecimento e apoio
A maior dor relatada por essas mães não é a maternidade em si, mas o constante esforço para serem levadas a sério. Muitas foram julgadas como “frias” ou “controladoras” por profissionais de saúde que desconhecem a apresentação do autismo em mulheres. Outras sentiram que, por parecerem “funcionais”, não precisavam de ajuda — o que apenas aprofundou o isolamento e o esgotamento.
Essa falta de compreensão faz com que muitos serviços ignorem as particularidades de ser mãe e autista ao mesmo tempo. Poucos estão preparados para enxergar essa dupla experiência — e menos ainda para acolhê-la.
A importância do diagnóstico e do autocuidado
Interessantemente, todas as participantes só descobriram o diagnóstico de autismo depois de se tornarem mães. Para muitas, o diagnóstico foi um alívio. Trouxe nome às dificuldades, diminuiu a culpa e possibilitou novas formas de se cuidar. Com isso, também se tornaram mães mais conscientes de si e mais autênticas nas relações com os filhos.
Maternidade como vínculo e transformação
O estudo também trouxe relatos emocionantes sobre a intensidade do amor e da conexão que essas mulheres sentem por seus filhos. A maternidade, apesar dos desafios, é uma fonte de crescimento pessoal, adaptação e sentido de vida. Mesmo quando o mundo externo não compreende, a relação entre mãe e filho autistas se torna um refúgio de compreensão mútua.
Por que precisamos falar sobre isso?
Autismo em mulheres adultas ainda é pouco reconhecido — e o mesmo vale para mães autistas. Visibilizar essas experiências é fundamental para que possamos construir uma rede de apoio mais sensível e eficaz. Para que essas mães não precisem “mascarar” ou “provar” sua capacidade, mas possam simplesmente ser o que são: mães que amam, sofrem, se dedicam — e, como qualquer outra, precisam de acolhimento e escuta.
Referência: Dugdale, A.-S., Thompson, A. R., Leedham, A., Beail, N., & Freeth, M. (2021). Intense connection and love: The experiences of autistic mothers. Autism, 25(7), 1973–1984. https://doi.org/10.1177/13623613211005987