Setembro Amarelo: o que precisamos repensar?

Setembro é o mês em que monumentos, prédios e ruas se iluminam de amarelo. A cada ano, o Setembro Amarelo reforça a importância de falar sobre suicídio e quebrar tabus. Mas, passados quase dez anos de campanha no Brasil, uma pergunta precisa ser feita: o que, de fato, mudou?

O que dizem os estudos

Pesquisas recentes têm analisado o impacto da campanha nas taxas de suicídio no Brasil — e os resultados não são animadores. Em vez de queda, os números mostram estabilidade ou até aumento em determinados grupos e períodos.

  • Entre 2011 e 2019, as taxas de suicídio subiram 28,5% no país, mesmo após o início da campanha.

  • Em alguns anos, como 2017 e 2019, houve até aumento do risco em homens e jovens de 15 a 29 anos.

  • Análises mais longas, de 2000 a 2019, identificaram uma aceleração do crescimento das taxas a partir de 2015, justamente quando a campanha começou.

Esses achados não significam que o Setembro Amarelo seja inútil. Pelo contrário: ele é fundamental para dar visibilidade ao tema, reduzir estigmas e abrir espaços de diálogo. Mas mostram também que conscientização sozinha não basta.

Grupos mais vulneráveis

As pesquisas apontam que o suicídio no Brasil é um fenômeno desigual, que atinge com mais força determinados grupos:

  • Jovens (15 a 29 anos): enfrentam bullying, pressão acadêmica, desemprego e dificuldades de acesso a serviços de saúde mental.

  • Idosos: vivem mais isolamento, depressão, doenças crônicas e perda de autonomia.

  • Povos Indígenas: apresentam taxas até quatro vezes maiores que a média nacional, ligadas a exclusão social, perda cultural, alcoolismo e conflitos territoriais.

  • Universitários: quase 10% relatam comportamentos suicidas, com maior vulnerabilidade em mulheres, pessoas LGBTQIA+ e estudantes nos primeiros anos de curso.

Esses dados mostram que falar em “suicídio” de forma genérica pode deixar invisíveis os fatores sociais, econômicos e culturais que sustentam o sofrimento.

O que falta?

A principal crítica dos pesquisadores é clara: faltam ações estruturais e políticas públicas efetivas. O Brasil ainda carece de:

  • Investimento na rede de saúde mental, para que o cuidado seja acessível e contínuo.

  • Formação de profissionais para lidar com o sofrimento psíquico e com o comportamento suicida.

  • Estratégias específicas para grupos de risco, culturalmente adaptadas e integradas às comunidades.

  • Ações multissetoriais, envolvendo educação, assistência social, mídia, segurança pública e políticas de combate às desigualdades.

Sem isso, a campanha corre o risco de se limitar a um símbolo bonito, mas sem efeito real na redução das mortes.

O papel da sociedade e da psicologia

A sociedade tem um papel essencial: escutar sem julgamento, acolher e apoiar políticas públicas que priorizem a saúde mental. Já os psicólogos e demais profissionais de saúde precisam estar preparados para identificar riscos, intervir precocemente e trabalhar em redes de apoio.

Mais do que iluminar monumentos, precisamos criar caminhos de cuidado contínuo.

Conclusão

O Setembro Amarelo abriu portas importantes para falar sobre suicídio. Mas os dados mostram que precisamos ir além: do discurso para a ação, da conscientização para a prevenção estruturada.

Falar sobre suicídio é falar do ponto final. Mas a prevenção começa muito antes — nos primeiros sinais de sofrimento, no fortalecimento de redes de apoio e na construção de políticas públicas sólidas.

📚 Referências

  • Cruz, R. M., Bortolanza, G. M., & Cruz, R. M. (2024). A brief research report of suicide rates in the Brazilian elderly over a 12-year period: the lack of association of the “Setembro Amarelo” campaign for suicide prevention. Frontiers in Psychiatry, 15, 1354030. https://doi.org/10.3389/fpsyt.2024.1354030

  • Cruz, R. M., Gonçalves, A. M., Bortolanza, G. M., et al. (2024). Analysis of the impact of the Brazilian Suicide Prevention Campaign “Yellow September”: an ecological study. Frontiers in Public Health, 12, 1382350. https://doi.org/10.3389/fpubh.2024.1382350

  • Silva, T. R., Orellana, J. D. Y., Machado, D. B., et al. (2024). Associations between a Brazilian suicide awareness campaign and suicide trends from 2000 to 2019: Joinpoint and regression discontinuity analysis. Journal of Affective Disorders, 366, 121–130. https://doi.org/10.1016/j.jad.2024.07.010

  • Wille Augustin, L., Rinozi Teixeira, P., & Kõlves, K. (2025). Suicidality and Suicide Prevention in Brazil: A Systematic Review of Reviews. International Journal of Environmental Research and Public Health, 22(8), 1183. https://doi.org/10.3390/ijerph22081183