O mês de Agosto Lilás reforça a importância de prevenir e combater a violência contra a mulher. Mas, dentro desse debate, há um dado que choca e precisa ganhar visibilidade: nove em cada dez mulheres autistas já foram vítimas de violência sexual.
Esse número vem de um estudo realizado na França e publicado na Frontiers in Behavioral Neuroscience por Cazalis, Reyes, Leduc e Gourion (2022).
O que o estudo investigou
A pesquisa foi feita com 225 mulheres autistas por meio de um questionário online. As perguntas abordavam histórico de violência sexual, idade na primeira agressão, ocorrência de novos abusos, consequências para a saúde mental e fatores de prevenção.
Para aumentar a precisão, as autoras usaram dois métodos de identificação: uma pergunta aberta sobre vitimização e um questionário padronizado (Sexual Experiences Survey). O segundo método mostrou números ainda mais altos, evidenciando que muitas mulheres não reconhecem imediatamente o que sofreram como violência sexual — seja por confusão, negação ou falta de informação sobre consentimento.
Resultados alarmantes
Os dados mostram que:
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88,4% das participantes já sofreram algum tipo de violência sexual.
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Mais de 2/3 foram vítimas pela primeira vez antes dos 18 anos, e mais da metade tinha 15 anos ou menos.
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Quase 85% das vítimas sofreram múltiplas agressões ao longo da vida.
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Após a violência, muitas relataram Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT), depressão, ansiedade, insônia, automutilação e repulsa a contato sexual.
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Apenas 1/3 denunciou o abuso, e na maioria dos casos a denúncia não resultou em ação efetiva.
Por que mulheres autistas estão mais vulneráveis?
O estudo destaca que não é o autismo em si que causa a violência — a raiz está na desigualdade de gênero, já apontada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como fator central para a violência contra mulheres.
Porém, algumas características associadas ao autismo, como dificuldades em decodificar intenções alheias ou identificar situações ambíguas, podem tornar mais difícil reconhecer e reagir a tentativas de abuso. Além disso, a estigmatização social e a exclusão aumentam a vulnerabilidade.
O que pode ser feito?
As autoras reforçam que a responsabilidade de prevenir não pode ser colocada sobre as vítimas, especialmente quando muitas são menores de idade no momento do abuso.
A prevenção efetiva, segundo a OMS e o CDC (Centers for Disease Control and Prevention), precisa incluir:
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Mudança de normas e crenças que sustentam a violência.
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Criação de ambientes seguros.
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Apoio acessível e especializado para vítimas.
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Educação para toda a sociedade sobre consentimento e respeito.
Um chamado à ação
Os números são claros: precisamos incluir mulheres autistas nas políticas de combate à violência, garantindo que serviços de saúde, segurança e assistência social estejam preparados para acolhê-las de forma adequada.
Que este Agosto Lilás seja mais um passo para romper o silêncio, ampliar a conscientização e exigir mudanças estruturais que protejam todas as mulheres — especialmente as mais vulneráveis.
📞 Se você está em situação de violência ou conhece alguém que esteja, ligue 180 – Central de Atendimento à Mulher. O serviço é gratuito e confidencial.
📚 Referência:
Cazalis, F., Reyes, E., Leduc, S., & Gourion, D. (2022). Evidence That Nine Autistic Women Out of Ten Have Been Victims of Sexual Violence. Frontiers in Behavioral Neuroscience, 16, 852203. https://doi.org/10.3389/fnbeh.2022.852203